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Editado por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2002 Sandra Field

© 2015 Harlequin Ibérica, S.A.

Cumes de paixão, n.º 700 - Janeiro 2015

Título original: Pregnancy of Convenience

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em português em 2003

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-6445-0

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Sumário

 

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

Volta

Capítulo 1

 

 

Cal Freeman pôs o limpa-pára-brisas no máximo e reduziu para a primeira. Não serviu de nada; a neve envolvia-o num mundo branco no qual, de vez em quando, via os altos postes que sinalizavam as margens da estrada estreita.

Pensou, ironicamente, que a visibilidade era melhor no lado nordeste do Evereste. Nunca tinha esperado um tempo assim no sul de Manitoba, apesar de ser Janeiro, mas o seu amigo Stephen tinha-lhe aconselhado que fosse prevenido ao ir visitar os Strassen, cuja casa estava a vários quilómetros da povoação mais próxima.

A escalada ao Evereste tinha sido um dos pontos culminantes da sua vida. O esforço físico, o vento gelado do norte, a decisão de chegar ao cimo sem oxigénio… De repente, Cal voltou à realidade e pisou o travão; tinha-lhe parecido ver um veículo na margem. O manto de neve dificultava a visão. Reduziu a velocidade ao mínimo e colou os olhos ao pára-brisas. Quem sabe se não teria sido uma miragem. Stephen e ele tinham ficado levantados até muito tarde, a porem-se a par do que aconteceu nos últimos quatro anos, e tinham bebido uma boa quantidade de vinho de Bordéus. Voltou a ver uma forma angular na margem, com o capô colado ao poste do telefone. Parou e ligou os piscas, apesar de duvidar que aparecesse algum carro no meio daquele temporal. Pôs o capucho da parka e as luvas. Não esperava encontrar ninguém dentro do veículo, mas queria ter a certeza.

Quando saiu do carro, a ventania empurrou-o com força. Sabia, pela rádio, que havia perigo de congelação da pele depois de mais de dois minutos ao ar. Mas estava habituado. Juntou o queixo ao peito e atravessou as marcas de gelo da estrada, a coxear levemente devido a uma antiga lesão no joelho.

O veículo era um carro branco e pequeno; uma má escolha. Se tivesse caído na vala, ninguém o teria visto. Deu-lhe um aperto no coração ao aperceber-se de que tinha alguém ao volante. Não sabia se era homem ou mulher.

Esquecendo-se do seu joelho, correu para o carro. O motor estava apagado e Cal perguntou-se há quanto tempo é que o carro teria saído da estrada. Limpou o pára-brisas com a luva; lá dentro estava uma mulher, sem gorro e, aparentemente, inconsciente. Tentou abrir a porta, mas estava fechada por dentro. Bateu no vidro, a gritar com força, mas a mulher não se moveu.

Cal voltou ao seu carro e tirou um pau da mala, com o qual bateu na janela traseira do automóvel acidentado. À terceira pancada, o vidro partiu-se. Rapidamente, destrancou a porta do condutor e abriu-a. Agarrou a mulher pela cintura e puxou-a pelos braços, apoiando-lhe o rosto no seu ombro. Voltou ao veículo, colocou-a no assento da frente e pôs-lhe o cinto de segurança. Depois, foi ao outro carro e trouxe uma mala que estava no assento. De regresso ao todo-o–terreno, pôs o aquecimento no máximo, tirou a parka e pô-la em cima da mulher. Então olhou para ela. A tempestade, o frio, o barulho do aquecimento, tudo desapareceu. O coração de Cal começou a bater acelerado; nunca tinha visto uma mulher tão bela. Tinha a pele suave como a seda, o cabelo preto azulado e brilhante, e traços perfeitos, desde a curva da boca às ondulantes maçãs do rosto e às pestanas delicadamente arqueadas.

Desejou-a, imediata e inequivocamente. Engoliu em seco, tentando recuperar a sensatez. Tinha um arranhão na testa; provavelmente tinha-se magoado no pára-brisas quando o carro bateu no poste. O seu rosto estava branco como a neve, tinha a pele fria e respirava com agitação. Devia estar louco para a considerar a mulher mais bela que alguma vez tinha visto. Além disso, não acreditava no amor à primeira vista, era um conceito ridículo. Perguntou-se porque é que a mão com a qual tinha tocado no seu queixo ardia como o fogo. Lançou uma exclamação de impaciência; estava só a cinco quilómetros da casa dos Strassen. O melhor que podia fazer era levá-la para lá. Quanto mais depressa estivesse numa casa com aquecimento e recuperasse a consciência, melhor. Tinha a impressão de que só estava sem sentidos e, também, morta de frio.

Arrancou, meteu a primeira e entrou na estrada. Tinha esperado chegar a casa dos Strassen muito antes e quem sabe estivessem preocupados com ele; o objectivo da sua visita não era agradável.

Estava a anoitecer e isso piorava a visibilidade. Grande parte da neve procedia dos campos, levantada pelo vento; não havia mais do que uma fileira de árvores. Tinha tido sempre respeito pelas alturas, mas no futuro também iria respeitar as planícies.

Admitiu para si que preferia pensar no tempo em vez de pensar na mulher. Provavelmente estava casada com um rancheiro e tinha um monte de filhos de cabelo escuro como as asas de um corvo. Pensou que deveria ter verificado se levava aliança. Na verdade, isso era indiferente; os Strassen saberiam o seu nome, fariam as chamadas necessárias e ela desapareceria da sua vida tão precipitadamente como tinha entrado.

Tinha conhecido muitas mulheres belas na sua vida; tinha, inclusive, estado casado durante nove anos. Por isso perguntou-se porque é que a pureza do perfil de uma desconhecida e a elegância da sua estrutura óssea o afectava como, se em vez de trinta e seis anos, tivesse os treze que tinha a sua filha.

Resmungou entre dentes, a esforçar-se para ver os postes de estrada. Tinha percorrido catorze quilómetros desde que deixou a auto-estrada; se as indicações de Strassen estavam correctas, só faltava um quilómetro. Perguntou-se como seria o casal de idosos cujo único filho, Gustave, um alpinista como ele, tinha morrido no Annapurna há três meses.

Cal ia entregar-lhes o equipamento para escalar e os poucos objectos pessoais que Gustave levava consigo na sua última expedição. Uma missão de caridade que lhe agradaria cumprir o mais rápido possível. O seu plano inicial tinha sido voltar à cidade nessa mesma noite, mas o temporal mudava tudo: tinha de dormir ali. Não lhe agradava a ideia, dado que não tinha conhecido Gustave Strassen pessoalmente.

Viu umas luzes entre a neve; devia ser a casa dos Strassen. Quatro minutos depois estava à porta. Sem apagar o motor, subiu os degraus da entrada de dois em dois e tocou à campainha. A porta abriu-se imediatamente; um homem gordo com barba por fazer cumprimentou-o efusivamente.

– Entre, entre. Deve ser o senhor Freeman, não traz casaco?

– Cal Freeman – disse Cal. – Senhor Strassen, trago uma mulher cujo o carro saiu da estrada. Partiu a cabeça e precisa de cuidados imediatos.

– Uma mulher? – O homem deu um passo para trás.

– Uma jovem – replicou o Cal, surpreendido e impaciente. – Estava só e acabou na vala. Vou buscá-la.

– Mas nós….

Cal, sem ouvir, voltou ao carro. Tentando manter a mulher tapada, tirou-a com cuidado e fechou a porta com o joelho. O vento tirou-lhe o capucho e, durante um segundo, viu as longas pestanas, escuras como o fuligem, a agitarem-se; ela entreabriu os lábios.

– Está bem – tranquilizou-a, – já está a salvo, não se preocupe – disse, ao subir as escadas. Dieter Strassen continuava com a porta aberta, mas já não sorria.

– Essa mulher não é bem-vinda à minha casa – disse, em voz alta.

– O que é que disse? – Cal entrou e fechou a porta com as costas.

– Tire-a daqui! Não quero voltar a vê-la – gritou uma voz por trás do Dieter. – Nunca mais, ouviu-me?

Cal adivinhou que devia ser Maria Strassen, a esposa de Dieter e mãe de Gustave. Baixa e magra como um palito, tinha o cabelo branco apanhado num carrapito cheio de ganchos. Esticou a palma da mão para Cal, como se o quisesse empurrar de novo para o nevão. A ele e à sua carga.

– Olhe – disse Cal, – não sei o que se passa, mas esta mulher precisa de ajuda. Perdeu os sentidos e está gelada. Precisa de comida quente e de uma cama. Não a podem ajudar?

– Seria melhor que tivesse morrido – disse Dieter, com uma amargura que assombrou Cal.

– Como o nosso filho – acrescentou Maria. – O nosso adorado Gustave.

– Onde fica a casa mais próxima? – perguntou Cal.

– A seis quilómetros – replicou Dieter.

– Sabe que não posso ir tão longe – afirmou Cal com determinação. – Não com esta tempestade. Não sei quem é esta mulher nem o que fez para que a odeiem, mas…

– Se a odiamos, senhor Freeman, é porque temos motivos para isso – disse Dieter com dignidade.

– Casou-se com o nosso Gustave – disse Maria com a voz gélida. – Casou-se com ele e destruiu-o.

Cal olhou-a, boquiaberto, encaixando as peças no seu lugar. Lembrou-se do que aconteceu num acampamento alpino, na encosta a sul do Monte Branco, quatro semanas antes.

 

 

Fazia calor para Dezembro e Cal estava descalço, a desfrutar da erva húmida depois de um árduo dia a escalar; tinha estado a experimentar umas botas para um amigo que desenhava calçado alpino. Um guia que acompanhava um grupo de alemães aproximou-se e apresentou-se como sendo Franz Staebel.

– Gustave gostava de se descalçar sempre depois de escalar… Conheceste o Gustave Strassen?

– Por estranho que pareça, não – respondeu Cal. – Os nossos caminhos cruzaram-se várias vezes, mas não nos chegámos a conhecer. Lamentei muito a sua morte.

– Era um alpinista excelente. Dos melhores. Uma desgraça – Franz contraiu o rosto e espetou o espeto com força no gelo. – Uma desgraça desnecessária.

– Porque é que dizes isso? – Cal apoiou as costas no tronco de uma árvore.

– A sua esposa – explicou Franz, tirando o espeto de uma só vez. – A sua esposa, Joanna. Estava grávida e ele ficou a saber um dia antes da escalada. Havia muitas possibilidades que o filho não fosse seu. Enganava-o, há anos que o fazia.

– Porque é que ele continuava com ela? – perguntou Cal.

– Terias de a ter visto. É bela como poucas mulheres. E com um corpo… o Gustave era humano. – Franz deu um pontapé na erva. – Nessa manhã, estava a pensar na Joanna e no bebé quando tentou subir o Annapurna pela rota três. Morreu durante a tentativa.

– Lamento – disse Cal. Sabia muito bem que as distracções eram fatais nas montanhas; podiam levar um homem à morte. – Não tinha ouvido falar da sua mulher.

– Além disso, ela é que controlava o dinheiro. Uma mulher rica que permitia que o Gustave utilizasse equipamento de segunda e que o obrigava a procurar patrocinadores para as suas escaladas. Terrível. Esse homem sofreu muito.

– De onde era?

– Do centro do Canadá – Franz deu uma gargalhada. – Das pradarias. Nem uma montanha à vista. Os pais ainda vivem lá.

– Tenho um bom amigo em Winnpeg – comentou Cal. – Conheço-o há alguns anos.

– A sério? Interessar-te-ia visitar o teu amigo e de passagem fazer um último favor a um alpinista que merecia melhor destino?

– O que é que queres dizer?

– Tenho o equipamento de Gustave em Zermatt. Ia enviá-lo aos pais pelo correio. Mas seria muito melhor se o entregasse um alpinista em pessoa.

– A verdade é que tenho uma semana livre no início do ano… depois de deixar a minha filha no colégio interno, aqui na Suíça – comentou o Cal. – Seria fantástico ver de novo o Stephen e a sua mulher.

– Seria um grande consolo para os Strassen. Devem ter o coração partido. A esposa de Gustave não perdeu tempo depois da sua morte; desfez-se do bebé. Podia ser do Gustave, era uma possibilidade… desta forma, desfez-se do neto dos Strassen, o seu último vínculo com o filho morto – cuspiu na erva. – Maldito o dia em que o Gustave se casou com essa mulher. Só lhe causou sofrimento.

 

 

– Senhor Freeman? – disse Dieter Strassen.

Cal voltou ao presente de repente e deu-se conta da ingrata notícia de que a mulher que estava nos seus braços era a causa directa da morte de um homem bom e da profunda dor dos seus pais.

– Lamento – murmurou, ao tentar recuperar-se. Não tinha razão para se sentir desiludido; meia hora antes nem sequer conhecia essa mulher, com a qual nem sequer tinha trocado uma única palavra. – Senhor Strassen – disse, – vejo que a minha chegada o aflige a si e à sua esposa, e lamento-o. Mas não vejo outra saída. Não a posso deixar estendida na neve, apesar de tudo.

– Conhece a história? – perguntou Dieter.

– Franz Staebel, o guia que tinha o equipamento do seu filho, falou-me da sua esposa há um mês.

– O Gustave estimava muito o Franz – Dieter voltou-se para a sua esposa. – Maria, colocamo-la no quarto das traseiras, é a única opção. Vai-se embora amanhã.

– Alguém terá de tomar conta dela – disse Maria com voz dura.

– Eu faço-o – afirmou Cal.

– Isso seria o melhor – aceitou Dieter com alívio evidente. – Indico-lhe o caminho, a Maria vai aquecer uma sopa. Estamos a ser muito maus anfitriões, senhor Freeman – inclinou a cabeça. – Bem-vindo à nossa casa.

– Obrigado – disse Cal, a sorrir para Maria.

– Essa mulher vai-se embora daqui amanhã – certificou-se ela, fria como o gelo, – e não voltará jamais.

– Ah! – o cérebro do Cal, adormecido desde que tinha encontrado aquela beleza de cabelo preto na valeta, por fim entendeu. – Tinha acabado de estar aqui?

– Teve a audácia de nos trazer o relógio de prata do Gustave e o seu álbum de fotos de família. Como se a fôssemos aceitar, perdoar-lhe tudo o que fez.

– Maria – advertiu Dieter.

– O nosso neto – disse Maria com voz trémula, – ainda para mais, destruiu o nosso neto. Abortou.

– Segundo o Gustave, podia não ser seu filho – disse Dieter, puxando o cabelo branco. – Gustave mandou-nos uma mensagem pela rádio no dia da sua morte, senhor Freeman. Sobre a gravidez e as suas dúvidas; queria divorciar-se dela – olhou com desdém para a mulher que Cal tinha nos braços. – Mas isso impediria que tivéssemos contacto com o bebé, que podia ser do nosso sangue.

– A Maria tirou-nos tudo.

– Bem, deixa – disse o seu marido. – Estou certo de que o senhor Freeman quererá comer depois de a acomodar.

– Por favor, trate-me por Cal… e sim, gostaria de comer uma sopa – aceitou Cal com um sorriso.

Maria foi para a cozinha. Dieter conduziu Cal por um longo corredor até a um anexo posterior. Os móveis eram escassos e tudo estava ordenado e impecável. O quarto de trás não era excepção e estava gelado.

– Desculpa a minha mulher, Cal – pediu Dieter. – Sente muita amargura. Deixarei que te instales. Quando estiveres pronto, vem à sala de jantar.

– Quando acordar, vai precisar de comer alguma coisa quente – comentou o Cal, estendendo Joanna Strassen em cima da cama de casal.

– Eu tratarei disso. E mostrar-te-ei o teu quarto, na parte principal da casa.

– Penso que será melhor ficar aqui e vigiar a sua nora – disse Cal com desinteresse, por saber que se ele não o fizesse mais ninguém o faria. – Depois de uma pancada na cabeça, é conveniente uma vigilância de doze horas.

– Como queiras – replicou Dieter. Lançou um olhar tão hostil à mulher inconsciente que, mesmo sabendo a história, Cal ficou gelado. – Há roupa de cama no armário e o sofá transforma-se em cama – continuou Dieter. – Vejo-te dentro de um bocado.

Assim que a porta se fechou, Cal pôs-se em acção. Puxou as cortinas, subiu o termóstato e acendeu a lareira. Quando a chamas atearam, voltou-se para a mulher.

Joanna Strassen, a viúva do Gustave. Pelo que diziam, era uma mulher infiel e pouco generosa que, aparentemente, tinha destruído o seu próprio filho.

Mas nada disso fazia com fosse menos bonita.